terça-feira, 14 de dezembro de 2010

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Eva







As imparidades de sua trajetória se refletem num olhar apurado sobre o que de insondável há na alma feminina por uma tangente de sensualidade. Mesmo antes de sua primeira exposição, em 1975, a fotógrafa francesa Irinia Ionesco já havia despertado o interesse de um grupo particular de artistas; mas seu êxito – paradoxal - e aclamação viriam de seu maior escândalo; a exposição Eloge de Ma Fille entraria na Galeria Nikon de Paris e era esse mesmo olhar fetichista agora voltado para ela, Eva Ionesco... dos 5 aos 10 anos, em ensaios eróticos.

Segundo Irina, a proposta que originou a série de fotografias surgiu da própria Eva; eram sem dúvidas anos muito diferentes dos nossos, de uma busca e aceitação da liberdade sexual, ou ainda da liberdade dos corpos. Como mulher e artista, fruto de sua época, não pareceu estranho à francesa que Eva também pudesse ser alvo de fotografias simbolistas e que fosse focada exatamente como as outras mulheres, adultas, alvos das lentes de Irina.

As datas divergem - uns falam em 4 a 11 anos, outros de 5 a 10 anos de idade; ficamos aqui com a segunda possibilidade por ser a mais encontrada nas fontes – mas, sistematicamente, ano após ano, a fotógrafa utilizou sua filha como modelo em fotografias branco & preto de extremo apuro e ousadia. Eva aparece em nus, mas o efeito aterrador é o mesmo se ela é capturada vestida, como isso? É intrigante.

Assim a menina Eva surge como criança-mulher nos mesmos ares sombrios, ornada com dezenas de jóias ou bijuterias, artefatos que falam deste mundo particular onde convivem delírio, morte, sensualidade e paixão. Seria quase uma entidade, um totem, um mito... Mas Eva era e é real. Comunidade artística e opinião pública se puseram maciçamente contra Irina; a primeira – que já classificava seu trabalho como um desfile de maus gostos – considerou a coleção como o ápice dos absurdos, aquilo simplesmente não era arte. Já o público, numa oposição já esperada e recorrente, a execrou alegando uma falta explícita de moralidade.

Nada disso, logicamente, impediria Eloge de ma Fille de entrar para a história da fotografia e do erotismo. Mesmo hoje, em que vivemos tempos de tão intenso tráfego de material de pedofilia, tempos que talvez nos turve a visão para certos aspectos fascinantes do bizarro ou do cruel, as fotografias que Irina Ionesco fez de sua filha permanecem inadvertidamente cheias do mesmo conceito, da mesma busca pela natureza do ser mulher vista através dos anos que passam para Eva e a revelam tão ou mais terrível (e uso terrível no sentido de espantoso) que a Lolita de Nobokov.